Versos, imagens e melancolia.
Disto faço o casulo do meu sonho.
Segrego tudo com a luz do dia,
E ali dentro me ponho.
Babo depois a concha de luar,
E zuno, zuno, como um sino ao vento.
E na baba que babo fica o mar,
E, no som que ali deixo, o meu lamento.
EM - POESIA COMPLETA VOL. I - MIGUEL TORGA - DOM QUIXOTE
quarta-feira, 30 de novembro de 2011
terça-feira, 29 de novembro de 2011
Obscura castidade - NATÁLIA CORREIA
Uma obscura e inquieta castidade
pôs uma flor para mim no jardim mais secreto
num horizonte de graça e claridade
intangível e perto.
Promessa estática no luar
da densidade em mim corpórea
não é a culpa, é a memória
da primeira manhã do pecado
sem Eva e se Adão.
Só o fruto provado
E a serpente enroscada
na minha solidão.
EM - POESIA COMPLETA - NATÁLIA CORREIA - DOM QUIXOTE
pôs uma flor para mim no jardim mais secreto
num horizonte de graça e claridade
intangível e perto.
Promessa estática no luar
da densidade em mim corpórea
não é a culpa, é a memória
da primeira manhã do pecado
sem Eva e se Adão.
Só o fruto provado
E a serpente enroscada
na minha solidão.
EM - POESIA COMPLETA - NATÁLIA CORREIA - DOM QUIXOTE
segunda-feira, 28 de novembro de 2011
Adolescente - JORGE SOUSA BRAGA
Viera acompanhada pela mãe
teria quinze ou dezasseis anos
Já não me lembro do motivo
Da consulta apenas da
Perturbação que me causaram
Os seus olhos cor de violeta
EM - A FERIDA ABERTA - JORGE SOUSA BRAGA - ASSÍRIO & ALVIM
teria quinze ou dezasseis anos
Já não me lembro do motivo
Da consulta apenas da
Perturbação que me causaram
Os seus olhos cor de violeta
EM - A FERIDA ABERTA - JORGE SOUSA BRAGA - ASSÍRIO & ALVIM
domingo, 27 de novembro de 2011
Aquele que quer morrer - MANUEL ANTÓNIO PINA
São chegados os tempos escandalosos
da Morte e da Inocência.
Aquele que quer saber e
apodrece de fora para dentro
dança já sobre os destroços do Futuro
com voláteis pés conceituais.
O sentido de tudo faz parte de tudo,
o Mistério não pode ser ocultado nem revelado.
Tudo o que passou
está a ser passado infinitamente
e o Futuro é a eternidade de isto
e tudo é sabido em si próprio.
EM - POESIA REUNIDA - MANUEL ANTÓNIO PINA - ASSÍRIO & ALVIM
da Morte e da Inocência.
Aquele que quer saber e
apodrece de fora para dentro
dança já sobre os destroços do Futuro
com voláteis pés conceituais.
O sentido de tudo faz parte de tudo,
o Mistério não pode ser ocultado nem revelado.
Tudo o que passou
está a ser passado infinitamente
e o Futuro é a eternidade de isto
e tudo é sabido em si próprio.
EM - POESIA REUNIDA - MANUEL ANTÓNIO PINA - ASSÍRIO & ALVIM
sábado, 26 de novembro de 2011
18 - ARMANDO SILVA CARVALHO
As falas não sossegam, nem mesmo
as do poema,
estão todas amarradas pela sua voz gritante
que não desaparece e foge,
de sala em sala, mas tão transfigurada,
a reclamar uma justiça feita à sua medida,
pela sobrevivência.
EM - DE AMORE - ARMANDO SILVA CARVALHO - ASSÍRIO & ALVIM
as do poema,
estão todas amarradas pela sua voz gritante
que não desaparece e foge,
de sala em sala, mas tão transfigurada,
a reclamar uma justiça feita à sua medida,
pela sobrevivência.
EM - DE AMORE - ARMANDO SILVA CARVALHO - ASSÍRIO & ALVIM
sexta-feira, 25 de novembro de 2011
Ao rosto vulgar dos dias - ALEXANDRE O'NEILL
Monstros e homens lado a lado,
Não à margem, mas na própria vida.
Absurdos monstros que circulam
Quase honestamente.
Homens atormentados, divididos, fracos.
Homens fortes, unidos, temperados.
*
Ao rosto vulgar dos dias,
À vida cada vez mais corrente,
As imagens regressam já experimentadas,
Quotidianas, razoáveis, surpreendentes.
*
Imaginar, primeiro, é ver.
Imaginar é conhecer, portanto agir.
EM - POESIAS COMPLETAS - ALEXANDRE O'NEILL - ASSÍRIO & ALVIM
Não à margem, mas na própria vida.
Absurdos monstros que circulam
Quase honestamente.
Homens atormentados, divididos, fracos.
Homens fortes, unidos, temperados.
*
Ao rosto vulgar dos dias,
À vida cada vez mais corrente,
As imagens regressam já experimentadas,
Quotidianas, razoáveis, surpreendentes.
*
Imaginar, primeiro, é ver.
Imaginar é conhecer, portanto agir.
EM - POESIAS COMPLETAS - ALEXANDRE O'NEILL - ASSÍRIO & ALVIM
quinta-feira, 24 de novembro de 2011
IV - MÁRIO CESARINY
Um corte nos dedos e agora
que estamos no inverno
vale a pena esperar mais depressa
a maravilha minúscula
o império
que foi comprado para bêbedos
a dez centavos o hectar
EM - PENA CAPITAL - MÁRIO CESARINY - ASSÍRIO & ALVIM
quarta-feira, 23 de novembro de 2011
O que é o espaço? - ANA HATHERLY
O que é o espaço
senão o intervalo
por onde
o pensamento desliza
imaginado imagens?
O biombo ritual da invenção
oculta o espaço intermédio
o interstício
onde a percepção se refracta
Pelas imagens
entramos em diálogo
com o indizível
EM - O PAVÃO NEGRO - ANA HATHERLY - ASSÍRIO & ALVIM
senão o intervalo
por onde
o pensamento desliza
imaginado imagens?
O biombo ritual da invenção
oculta o espaço intermédio
o interstício
onde a percepção se refracta
Pelas imagens
entramos em diálogo
com o indizível
EM - O PAVÃO NEGRO - ANA HATHERLY - ASSÍRIO & ALVIM
terça-feira, 22 de novembro de 2011
Fizeste... - LUÍS FALCÃO
Fizeste da tua vida
Uma catedral abandonada
Horas esquecidas
Em adoração nocturna
Pedindo silêncio
A tudo o que perdeste.
EM - PÉTALAS NEGRAS ARDEM NOS TEUS OLHOS - LUÍS FALCÃO - ASSÍRIO & ALVIM
Uma catedral abandonada
Horas esquecidas
Em adoração nocturna
Pedindo silêncio
A tudo o que perdeste.
EM - PÉTALAS NEGRAS ARDEM NOS TEUS OLHOS - LUÍS FALCÃO - ASSÍRIO & ALVIM
segunda-feira, 21 de novembro de 2011
Lacrimatória 14 - JAIME ROCHA
A ilha torna-se ainda mais clara aos olhos do
homem. Aquilo que parecia um círculo de pedra
em torno dos ciprestes é agora uma plataforma
de relva estendida na água como se se tivesse
transformado subitamente num pequeno navio
petrificado, como se o castigo de um deus tivesse
caído sobre ela e a devolvesse a um espaço parado.
Apenas os corvos e as garças mostram, com os
bicos, restos de bois que velhos marinheiros ali
tinham devorado, escondidos do sol e da tempestade.
Ao contornar os rochedos, ele descobre os vestígios
de uma muralha, uma linha de terra dura, de ferrugem
e de toros com enormes pregos espetados e cruzadas
entre si.
EM - LACRIMATÓRIA - JAIME ROCHA - RELÓGIO D'ÁGUA
homem. Aquilo que parecia um círculo de pedra
em torno dos ciprestes é agora uma plataforma
de relva estendida na água como se se tivesse
transformado subitamente num pequeno navio
petrificado, como se o castigo de um deus tivesse
caído sobre ela e a devolvesse a um espaço parado.
Apenas os corvos e as garças mostram, com os
bicos, restos de bois que velhos marinheiros ali
tinham devorado, escondidos do sol e da tempestade.
Ao contornar os rochedos, ele descobre os vestígios
de uma muralha, uma linha de terra dura, de ferrugem
e de toros com enormes pregos espetados e cruzadas
entre si.
EM - LACRIMATÓRIA - JAIME ROCHA - RELÓGIO D'ÁGUA
domingo, 20 de novembro de 2011
Vela - MIGUEL TORGA
Rondo.
Mas nem sei o que guardo, nem conheço
Quem me manda ficar se sentinela...
Sei apenas que é um crime se adormeço
E deixo de espreitar pela janela.
Rondo.
Como soldado lírico que sou.
Se é manhã,
Se é poema,
Se é luar, o que vem,
- Sabe-o quem me acordou,
Se foi alguém...
EM - POESIA COMPLETA VOL. I - MIGUEL TORGA - DOM QUIXOTE
Mas nem sei o que guardo, nem conheço
Quem me manda ficar se sentinela...
Sei apenas que é um crime se adormeço
E deixo de espreitar pela janela.
Rondo.
Como soldado lírico que sou.
Se é manhã,
Se é poema,
Se é luar, o que vem,
- Sabe-o quem me acordou,
Se foi alguém...
EM - POESIA COMPLETA VOL. I - MIGUEL TORGA - DOM QUIXOTE
sábado, 19 de novembro de 2011
Mãe ausente - NATÁLIA CORREIA
A que partiu ficou vibrando
no som da corda que se quebrou.
Arco de violino retesado
e depois partido pelo vento
era a natureza a separar-se
do que nela criado
a renegou em dança e em vertigem
para que o olhar em pranto deslumbrado
intacta a repusesse na origem.
EM - POESIA COMPLETA - NATÁLIA CORREIA - DOM QUIXOTE
no som da corda que se quebrou.
Arco de violino retesado
e depois partido pelo vento
era a natureza a separar-se
do que nela criado
a renegou em dança e em vertigem
para que o olhar em pranto deslumbrado
intacta a repusesse na origem.
EM - POESIA COMPLETA - NATÁLIA CORREIA - DOM QUIXOTE
sexta-feira, 18 de novembro de 2011
O anencéfalo - JORGE SOUSA BREGA
Condenado a morrer dentro de
Escassos dias o pediatra esculpira-lhe
Com gazes o resto do crânio
Que lhe faltava. Havia flores
Em todas as mesas. na de sua
Mãe nem um gerânio
EM - A FERIDA ABERTA - JORGE SOUSA BRAGA - ASSÍRIO & ALVIM
Escassos dias o pediatra esculpira-lhe
Com gazes o resto do crânio
Que lhe faltava. Havia flores
Em todas as mesas. na de sua
Mãe nem um gerânio
EM - A FERIDA ABERTA - JORGE SOUSA BRAGA - ASSÍRIO & ALVIM
quinta-feira, 17 de novembro de 2011
Transforma-se a coisa estrita no escritor - MANUEL ANTÓNIO PINA
Isto está cheio de gente
falando ao mesmo tempo
e alguma coisa está fora de isto falando de isto
e tudo é sabido em qualquer lugar.
(Chamo-lhe Literatura porque não sei o nome de isto;)
o escritor é uma sombra de uma sombra
o que fala põe-o fora de si
e de tudo o que não existe.
Aquele que quer saber
tem o coração pronto para o
roubo e para a violência
e a alma pronta para o esquecimento.
EM - POESIA REUNIDA - MANUEL ANTÓNIO PINA - ASSÍRIO & ALVIM
falando ao mesmo tempo
e alguma coisa está fora de isto falando de isto
e tudo é sabido em qualquer lugar.
(Chamo-lhe Literatura porque não sei o nome de isto;)
o escritor é uma sombra de uma sombra
o que fala põe-o fora de si
e de tudo o que não existe.
Aquele que quer saber
tem o coração pronto para o
roubo e para a violência
e a alma pronta para o esquecimento.
EM - POESIA REUNIDA - MANUEL ANTÓNIO PINA - ASSÍRIO & ALVIM
quarta-feira, 16 de novembro de 2011
16 - ARMANDO SILVA CARVALHO
Às vezes na cozinha,
entre a loiça suja e o metal já frio
dos talheres diários,
um sopro de súbito leva-te a pensar
que ela está a chegar, tão quente e tão diligentemente
dona do trabalho, do valor do uso,
senhora do lugar.
EM - DE AMORE - ARMANDO SILVA CARVALHO - ASSÍRIO & ALVIM
entre a loiça suja e o metal já frio
dos talheres diários,
um sopro de súbito leva-te a pensar
que ela está a chegar, tão quente e tão diligentemente
dona do trabalho, do valor do uso,
senhora do lugar.
EM - DE AMORE - ARMANDO SILVA CARVALHO - ASSÍRIO & ALVIM
terça-feira, 15 de novembro de 2011
O tempo faz caretas - ALEXANDRE O'NEILL
Visto que não há regresso
E o tempo está de mau cariz,
Viremos o dia do avesso
Para ver como é, primeiro.
A carranca dum velho ou o traseiro
Prazenteiro dum petiz?
EM - POESIAS COMPLETAS - ALEXANDRE O'NEILL - ASSÍRIO & ALVIM
E o tempo está de mau cariz,
Viremos o dia do avesso
Para ver como é, primeiro.
A carranca dum velho ou o traseiro
Prazenteiro dum petiz?
EM - POESIAS COMPLETAS - ALEXANDRE O'NEILL - ASSÍRIO & ALVIM
segunda-feira, 14 de novembro de 2011
III - MÁRIO CESARINY
Poucos conhecem uma carta
uma carta e um bilhete ilustrado com a tradução
duma estrofe
S. Marcos o sol a Santa Catarina
como se fosse no inverno à lareira
«no escuro dessas noites mal iluminadas enevoadas
desertas em que as casas com luz interior ou sem ela
têm muito relevo são pesadas e misteriosas»
Poucos poucos conhecem
os últimos dias do enigma
de uma porta chapeada de alto a baixo
à beira de um caminho ladeado de sebes de espinheiro
EM - PENA CAPITAL - MÁRIO CESARINY - ASSÍRIO & ALVIM
domingo, 13 de novembro de 2011
As impensáveis portas da ilusão - ANA HATHERLY
O que é que leva o meu barco
para esta praia
onde um poder esquivo
se contenta
com a ambígua oferta de palavras?
Estamos aqui
no exíguo barco do desejo
exibidos
na frágil singularidade do verbo
Insatisfeitos sempre
aguardamos
que se abram
as impensáveis portas da ilusão
EM - O PAVÃO NEGRO - ANA HATHERLY - ASSÍRIO & ALVIM
para esta praia
onde um poder esquivo
se contenta
com a ambígua oferta de palavras?
Estamos aqui
no exíguo barco do desejo
exibidos
na frágil singularidade do verbo
Insatisfeitos sempre
aguardamos
que se abram
as impensáveis portas da ilusão
EM - O PAVÃO NEGRO - ANA HATHERLY - ASSÍRIO & ALVIM
sábado, 12 de novembro de 2011
Atravessa o pátio... - LUÍS FALCÃO
Atravessa o pátio de Limoeiros
Enquanto um sino chama para a oração da tarde
Purifica olhos e mãos
Recita um salmo que te prepare para a chegada da noite
Ainda que saibas
Que a tua vida nunca será tocada por essa brisa que passa.
EM - PÉTALAS NEGRAS ARDEM NOS TEUS OLHOS - LUÍS FALCÃO - ASSÍRIO & ALVIM
Enquanto um sino chama para a oração da tarde
Purifica olhos e mãos
Recita um salmo que te prepare para a chegada da noite
Ainda que saibas
Que a tua vida nunca será tocada por essa brisa que passa.
EM - PÉTALAS NEGRAS ARDEM NOS TEUS OLHOS - LUÍS FALCÃO - ASSÍRIO & ALVIM
sexta-feira, 11 de novembro de 2011
Lacrimatória 9 - JAIME ROCHA
Puxa-a pelos braços enquanto um cão vigia o
caminho. A folhagem desprende-se com o
movimento e a nudez espalha-se pela erva
anunciando um momento de loucura. Um outro
cão surge do mato com uma perdiz na boca e os
dois ficam a olhá-la enquanto uivam. O homem
cobre-a de seda encarnada, deixando que o peito
toque no chão e desse lugar se soltem dois corvos
bravos. Há um cisne que procura chegar-se à água
e garças que aguardam as migalhas deixadas pelos
peixes. Tudo se concretiza dentro de uma zona escura,
de uma rede, perto de um precipício, mas o homem
não consegue sequer levantar o rosto com os dedos.
EM - LACRIMATÓRIA - JAIME ROCHA - RELÓGIO D'ÁGUA
caminho. A folhagem desprende-se com o
movimento e a nudez espalha-se pela erva
anunciando um momento de loucura. Um outro
cão surge do mato com uma perdiz na boca e os
dois ficam a olhá-la enquanto uivam. O homem
cobre-a de seda encarnada, deixando que o peito
toque no chão e desse lugar se soltem dois corvos
bravos. Há um cisne que procura chegar-se à água
e garças que aguardam as migalhas deixadas pelos
peixes. Tudo se concretiza dentro de uma zona escura,
de uma rede, perto de um precipício, mas o homem
não consegue sequer levantar o rosto com os dedos.
EM - LACRIMATÓRIA - JAIME ROCHA - RELÓGIO D'ÁGUA
quinta-feira, 10 de novembro de 2011
Certeza - MIGUEL TORGA
Sereno, o parque espera.
Mostra os braços cortados,
E sonha a primavera
Com seus olhos gelados.
É um mundo que há-de vir
Naquela fé dormente;
Um sonho que há-de abrir
Em ninhos e semente.
Basta que um novo sol
Desça do velho céu,
E diga ao rouxinol
Que a vida não morreu.
EM - POESIA COMPLETA VOL. I - MIGUEL TORGA - DOM QUIXOTE
Mostra os braços cortados,
E sonha a primavera
Com seus olhos gelados.
É um mundo que há-de vir
Naquela fé dormente;
Um sonho que há-de abrir
Em ninhos e semente.
Basta que um novo sol
Desça do velho céu,
E diga ao rouxinol
Que a vida não morreu.
EM - POESIA COMPLETA VOL. I - MIGUEL TORGA - DOM QUIXOTE
quarta-feira, 9 de novembro de 2011
A floresta da infância - NATÁLIA CORREIA
Húmido pinhal de ramos altos
como lanças no coração de estrelas
petrificado no olhar dos deuses!
Quem como eu no chão de rama verde
estendida se perde
entre as metamorfoses e os meses?
Quem com eu errando na floresta
embriagada de névoa e de resina
teus deuses celebrou em cada festa
da alma e da retina?
Quem como eu num canto que persiste
te oferece a imagem que guardei
do teu mistério triste?
EM - POESIA COMPLETA - NATÁLIA CORREIA - DOM QUIXOTE
terça-feira, 8 de novembro de 2011
Uns lábios húmidos - JORGE SOUSA BRAGA
Recusara a mastectomia e agora
Os seus seios eram uma massa informe
Cheia de locas de pus. A custo
Se adivinhavam os mamilos
Aonde ainda não há muito tempo
Pousavam uns lábios húmidos
EM - A FERIDA ABERTA - JORGE SOUSA BRAGA - ASSÍRIO & ALVIM
segunda-feira, 7 de novembro de 2011
A pura luz pensante - MANUEL ANTÓNIO PINA
Tudo é tudo ou quase tudo
e nada é a mesma coisa.
Na realidade são tudo coisas indiferentes.
(Imagens... Imagens... Imagens...)
É este o caminho da Inocência? Exis-
te tudo e a aparência de tudo. (Imagens...)
Totalmente tolerante é
a matéria metafórica da infância.
Tenho que tornar a fazer tudo,
a emoção é um fruto fútil, a pura luz
pensando dos dois lados da Literatura.
Aqui estão as palavras, meti o focinho nelas!
EM - POESIA REUNIDA - MANUEL ANTÓNIO PINA - ASSÍRIO & ALVIM
e nada é a mesma coisa.
Na realidade são tudo coisas indiferentes.
(Imagens... Imagens... Imagens...)
É este o caminho da Inocência? Exis-
te tudo e a aparência de tudo. (Imagens...)
Totalmente tolerante é
a matéria metafórica da infância.
Tenho que tornar a fazer tudo,
a emoção é um fruto fútil, a pura luz
pensando dos dois lados da Literatura.
Aqui estão as palavras, meti o focinho nelas!
EM - POESIA REUNIDA - MANUEL ANTÓNIO PINA - ASSÍRIO & ALVIM
domingo, 6 de novembro de 2011
14 - ARMANDO SILVA CARVALHO
Deves caminhar a memória
para alicerces firmes e não exaltar o pranto
corrompido por imagens remotas, pelo espanto oculto
nas palavras soltas pelos corredores.
Tinhas só uma certeza: a morte dava os seus passos seguros
naquele corpo acossado, cada vez mais só,
e que já não te via nem ouvia.
EM - DE AMORE - ARMANDO SILVA CARVALHO - ASSÍRIO & ALVIM
para alicerces firmes e não exaltar o pranto
corrompido por imagens remotas, pelo espanto oculto
nas palavras soltas pelos corredores.
Tinhas só uma certeza: a morte dava os seus passos seguros
naquele corpo acossado, cada vez mais só,
e que já não te via nem ouvia.
EM - DE AMORE - ARMANDO SILVA CARVALHO - ASSÍRIO & ALVIM
sábado, 5 de novembro de 2011
Canção - ALEXANDRE O'NEILL
Que saia a última estrela
da avareza da noite
e a esperança venha arder
venha arder em nosso peito
E saiam também os rios
da paciência da terra
É no mar que a aventura
tem as margens que merece
E saiam todos os sóis
que apodreceram no céu
dos que não quiseram ver
- mas que saiam de joelhos
E das mãos que saiam agora
de pura transformação
Entre o real e o sonho
seremos nós a vertigem
EM - POESIAS COMPLETAS - ALEXANDRE O'NEILL - ASSÍRIO & ALVIM
da avareza da noite
e a esperança venha arder
venha arder em nosso peito
E saiam também os rios
da paciência da terra
É no mar que a aventura
tem as margens que merece
E saiam todos os sóis
que apodreceram no céu
dos que não quiseram ver
- mas que saiam de joelhos
E das mãos que saiam agora
de pura transformação
Entre o real e o sonho
seremos nós a vertigem
EM - POESIAS COMPLETAS - ALEXANDRE O'NEILL - ASSÍRIO & ALVIM
sexta-feira, 4 de novembro de 2011
II - MÁRIO CESARINY
A 10 000 metros de profundidade
o rosto deambulador
do soldado
que não quis morrer
grita o seu radioso segredo:
Abre as portas do teu coração
é tão fácil perder
o homem das águias
que nunca mudam
Ele
em verdade
está só
e nunca
foi ouvido
EM - PENA CAPITAL - MÁRIO CESARINY - ASSÍRIO & ALVIM
quinta-feira, 3 de novembro de 2011
Nostalgia - ANA HATHERLY
Na caixa da ferramenta do poeta
a nostalgia é o instrumento
duma lassidão crepuscular
assassina do dia
A memória
é um conservatório de combates
mais ou menos arrumados
mais ou menos diferidos
para a caixa dos conceitos
Obscuro simulacro do real
sombra desmaiada
emergindo cada vez mais lenta
a nostalgia é o adeus da paixão
EM - O PAVÃO NEGRO - ANA HATHERLY - ASSÍRIO & ALVIM
a nostalgia é o instrumento
duma lassidão crepuscular
assassina do dia
A memória
é um conservatório de combates
mais ou menos arrumados
mais ou menos diferidos
para a caixa dos conceitos
Obscuro simulacro do real
sombra desmaiada
emergindo cada vez mais lenta
a nostalgia é o adeus da paixão
EM - O PAVÃO NEGRO - ANA HATHERLY - ASSÍRIO & ALVIM
quarta-feira, 2 de novembro de 2011
Sentir... - LUÍS FALCÃO
Sentir a cair das folhas
Como uma advertência íntima
O primeiro passo para um encontro
Um regresso ao coração.
EM - PÉTALAS NEGRAS ARDEM NOS TEUS OLHOS - LUÍS FALCÃO - ASSÍRIO & ALVIM
Como uma advertência íntima
O primeiro passo para um encontro
Um regresso ao coração.
EM - PÉTALAS NEGRAS ARDEM NOS TEUS OLHOS - LUÍS FALCÃO - ASSÍRIO & ALVIM
terça-feira, 1 de novembro de 2011
Lacrimatória 1 - JAIME ROCHA
Esta é a fala do homem, uma dor súbita
definitivamente entregue a um deus de água.
Saída do fogo, deitada numa terra onde um
corvo poisa pela manhã, a mulher espera que
alguém a transporte para uma zona de silêncio.
Todos os pássaros foram banidos pela chuva.
São eles que a acompanham agora num rasto
de sangue, em cima de uma abóbada branca
e lhe devoram os vestidos. Largada num poço,
à espera de uma visão redentora, a olhar
para os varões de ferro cravados nas paredes,
ela espera que o céu se feche ou que a ausência
de um grito inicie de vez a sua tortura. O homem
prepara-se para a batalha, vêem-se já nas suas
mãos as marcas do veneno-
EM - LACRIMATÓRIA - JAIME ROCHA - RELÓGIO D'ÁGUA
definitivamente entregue a um deus de água.
Saída do fogo, deitada numa terra onde um
corvo poisa pela manhã, a mulher espera que
alguém a transporte para uma zona de silêncio.
Todos os pássaros foram banidos pela chuva.
São eles que a acompanham agora num rasto
de sangue, em cima de uma abóbada branca
e lhe devoram os vestidos. Largada num poço,
à espera de uma visão redentora, a olhar
para os varões de ferro cravados nas paredes,
ela espera que o céu se feche ou que a ausência
de um grito inicie de vez a sua tortura. O homem
prepara-se para a batalha, vêem-se já nas suas
mãos as marcas do veneno-
EM - LACRIMATÓRIA - JAIME ROCHA - RELÓGIO D'ÁGUA
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